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segunda-feira, 28 de março de 2016

UM AVÔ DE POUCAS FALAS

O avô não fala, não porque seja mudo, mas por opção. Seria mais correto dizer que o avô geralmente não fala ou então dizer que fala pouco. Habitualmente fica sentado no seu cadeirão, manta nos joelhos, de olhos postos na televisão. Na maioria das vezes o avô olha para o ecrã sem nada ver. Embora experimente algumas limitações ao nível da audição, vai ouvindo excertos das conversas que se desenrolam à sua volta como que numa outra dimensão. Quem o vê sentado no cadeirão, fica com a impressão de que está à espera de algo ou de alguém… Na verdade, numa fase da vida em que já nada ou pouco se espera, só uma coisa o consegue tirar daquela modorra: a incursão dos netos pela casa dentro. Aí o avô transfigura-se, parece pouco mais velho do que os próprios netos condescendendo com todas (ou quase) as suas tropelias. Fora isso, o avô fica entregue às suas memórias e elas são tantas vindas ao seu encontro sabe-se lá de onde! O avô preferia que algumas delas ficassem esquecidas no baú das lembranças, mas não, são precisamente essas as que mais teimam em voltar.
Voltar é quase como andar para trás quando a vida nos toca para a frente… O avô sabe disso e assim que tais lembranças o assaltam, ele as faz regressar ao baú do esquecimento.

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