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segunda-feira, 28 de maio de 2012

CARTA PARA MINHA IRMÃ

Olá!
Hoje senti vontade de te escrever. Ainda não sei bem como enviar esta mensagem/carta/e-mail, ou o que quer que seja. Não estou preocupado com isso porque estou convicto que a irás "ler"…
Desejo do fundo do coração que estejas bem, onde quer que te encontres…
Estranho, não achas? Passei o dia de ontem a reviver o nosso apartamento no Campo Alegre onde te acolhemos. Ali morámos alguns anos na companhia da mãe e do nosso padrasto. O Miguel estava na Guiné por isso te cedi o meu quarto. Vieram-me à memória as nossas noites em frente à TV sem dizer palavra…
Nesse tempo, éramos puros. Não no sentido restrito da palavra, tínhamos já percorrido vários caminhos sem saída no labirinto da vida. Mas éramos puros e comunicávamos entre nós sem precisar de palavras. Eu sabia sempre o que ias dizer assim como tu me adivinhavas… por isso deixamos de articular por palavras os nossos pensamentos. Bastava uma troca de olhares para desencadear o riso ou as lágrimas perante o que víamos na TV ou nas cenas do dia-a-dia.
Lembras como a mãe ficava roída de ciume da nossa comunicação telepática?
Ela sempre se referia a ti como minha alma gémea…
Nesse tempo, éramos puros.
O veneno da intriga ainda não nos corroía as entranhas. O mesmo veneno que nos separou durante longos anos. Relembro a propósito Óscar Wild que muito admiro pela sua filosofia de vida. Ele dizia Devem-se escolher os amigos pela beleza, os conhecidos pelo caráter e os inimigos pela inteligência. Lembro-me de dizeres que tinhas muito medo dos inimigos burros. Na altura não alcancei muito bem o que querias dizer. Hoje compreendo e concordo contigo. Quem lançou o veneno entre nós não tinha nenhuma má intenção fê-lo apenas por burrice…
Uma multidão de recordações foi desfilando na minha mente até chegar aquele jantar de despedida… Não vou esquecer nunca a dignidade dessa despedida. Apesar da doença conseguias brilhar com o resplendor da tua antiga beleza. De tal forma que no momento me convenci que estarias a recuperar… Foi durante o jantar que me apercebi que era uma despedida... Um aperto, um "nó na garganta" impedia o bolo alimentar de passar de deslizar ao longo do esófago. Obriguei-me a engolir o jantar. Não sei porque estranha razão mas sentia que era imperioso fingir não entender estar perante a tua despedida. E fingi. Eu sabia que querias que assim fosse...
Hoje eu sei que é assim que quero partir. Despedindo-me dos amigos mais chegados… sem drama… sem lágrimas… mas em todo o esplendor (que ainda me resta)...

2 comentários:

  1. Bonita carta.
    Pense que tem mais um Anjo no Céu a cuidar de si.
    "As palavras de amizade e conforto podem ser curtas e sucintas, mas o seu eco é infindável".
    Abraço amigo.

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