Podia
ficar ali sentada para sempre, num simples bloco de granito, parte integrante do
muro que separa a estrada da praia. Podia se não fosse o apelo dos afazeres
familiares, mas agora ali estava naquela modorra vinda do calor morno do sol de
inverno que acalentava aquela tristeza. Havia nela essa tristeza de uma dor que
já não dói, de uma urgência que se fez tarde, de uma importância que se tornou
banal. A cada traição que ela adivinhava, acontecia aquela dor misto de raiva e
desilusão. A raiva de não ter provas para o confrontar, a desilusão de encontrar
defeitos em quem queria ver perfeito. Há dores que ficam, mas acabam por deixar
de doer seja por habituação, insensibilidade ou catarse emocional… e dessas
dores é que lhe vinha aquela tristeza.
Porquê ficar
triste se já nem a dor da traição a incomoda?! Estranhava ela perdida nos seus
pensamentos. É que dá medo quando a dor se ausenta e deixa de doer, quando o
que importa deixa de importar…
Nesse
preciso momento compreendeu que a razão de tanta tristeza, era afinal a ausência
da dor. Através dessa ausência é que lhe veio a certeza de que o que antes foi,
agora já não é…
Podia
ficar ali sentada a surpreender-se de já não sentir a dor não fora o apelo dos
afazeres familiares. Levantou-se, alisou a parte posterior da saia, esboçou um
sorriso que mais parecia um esgar e dirigiu-se para casa.
Que pena não ter concorrido, Jorge! Dolorosamente profundo e belo. Adorei o texto.
ResponderEliminarObrigado Teresa. Não achei que merecia concorrer mas se calhar... merecia.
EliminarMerecia, sem qualquer dúvida.
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